Fotogrametria. Como escolher uma boa câmera?
As grametrias, e em especial a fotogrametria, é uma técnica utilizada há muitas décadas, contudo, foi com o advento da câmera digital, da computação, e por último os drones, é que a tecnologia se tornou palpável e acessível a praticamente qualquer pessoa.
Num outro artigo nosso, falamos mais profundamente das diferenças das duas principais técnicas utilizadas atualmente, basta clicar aqui.
Neste artigo, vamos tratar especificamente da fotogrametria RGB, aquela cujo sensor é uma câmera fotográfica RGB. Pois bem, esta técnica, é de longe o tipo de mapeamento com capacidade de fornecer o maior grau possível de informações da área mapeada, contudo, para que ela tenha um nível de qualidade desejada, é necessário ter atenção a algumas limitações ou complexidade, próprias da técnica como: dependência de luz natural de qualidade, pós processamento demorado e e trabalhoso, e a qualidade do sensor utilizado, e neste último será o foco deste material.
Então, aprofundando nas características de uma boa câmera para fotogrametria, devemos levar em conta alguns pontos que diferem ela de câmeras convencionais, presentes em celulares, filmadoras e na grande maioria dos drones comerciais não especializados em fotogrametria. Vamos entender os principais diferenciais.
Obturador Mecânico
Existem 2 tipos de obturadores em câmeras digitais, e estes dois tipos podem ser mais úteis ou mais economicamente viáveis para cada tipo de aplicação. Mas o que é o obturador?
O obturador nada mais é que o dispositivo que controla o tempo de exposição (ou obturação) do sensor à luz, que nada mais é que o período de tempo que o sensor é exposto à luz que entra pela lente e que forma a fotografia. No obturador eletrônico, o sensor simplesmente liga e desliga, neste intervalo de tempo. Já no obturador mecânico, o sensor é coberto por uma cortina física (como uma janela) que faz um movimento mecânico de “abrir e fechar” neste intervalo de tempo.
Na prática, eles fazem uma função análoga, é como se em um, abríssemos a porta do quarto e fechássemos em seguida, somente o tempo determinado para que a luz da sala entre no quarto, no caso o obturador mecânico. No outro, a porta fica sempre aberta, o que fazemos é acender a luz no apagador, e apagar em seguida depois do tempo determinado.
Apesar de parecerem apenas maneiras diferentes de fazer as coisas, isso gera um impacto na fotografia relativo à distorção de linhas, em especial quando o sensor está em movimento em relação ao alvo (como no caso do drone em voo), veja na imagem abaixo como este efeito ocorre nas fotos.

Perceba o que acontece com o poste, e igualmente com as linhas de contorno das paredes da casa ao fundo. As linhas se distorcem em parábolas, e este efeito fica mais agudo conforme se aumenta a velocidade relativa do sensor em relação ao alvo, e tornando-se imperceptível, quando estamos parados (por isso não percebemos isto nos nossos celulares). Este tipo de distorção, acaba por comprometer a qualidade de qualquer levantamento aerofotogramétrico cuja finalidade envolva qualquer tipo de medição e não se resuma a uma simples inspeção.
Obturadores mecânicos não tem só qualidades, tem defeito também, e o grande defeito é o custo de aquisição e manutenção, por dois motivos, um consequência do outro. Primeiro, custo de fabricação, uma vez que o obturador mecânico é um dispositivo físico (uma peça a mais), e por ser algo de precisão e velocidade, o torna caro e tem impacto direto no custo do equipamento. O segundo, é vida útil, pois obturadores mecânicos tem tempo de vida útil, que pode variar pra mais ou para menos de um equipamento para outro ou de uma marca para outra, mas todos tem vida útil, com as menores durações na casa de 100.000 fotos e as maiores na casa de 1.000.000 de fotos, com valores proporcionais. Por isso o custo de fotogrametrias profissionais é tão elevado, já que o principal equipamento tem uma vida útil determinada, e relativamente curta quando levamos em conta que levantamentos sempre bate fotos na cada dos milhares.
Portanto, ter uma câmera com obturador mecânico é essencial para se construir um produto de qualidade, confiável e fidedigno de formas e medidas. A maioria dos drones comerciais utilizados, não contam com este recurso.
Velocidade do Obturador
Agora que entendemos a importância de um obturador mecânico, e também já entendemos o que é tempo de obturação ou tempo de exposição, temos aqui uma característica também muito importante na aerofotogrametria. Vamos lembrar, que o obturador mecânico abre, e depois fecha, por tempo suficiente apenas para entrar a quantidade de luz calculada para aquela foto.
Há de se entender, que como o sensor está em movimento, a correta relação entre velocidade de voo e tempo de obturação é muito importante para se obter fotografias nítidas e estáticas. Quando maior a velocidade de voo, menor deve ser o tempo de obturação, com a finalidade de se evitar rastros nos pixels, vela a foto abaixo.

O tempo de obturação é informado numa relação de fração de 1 segundo, como pode ser observado na foto acima. Quanto menor o tempo de obturação que a câmera é capaz de fazer, maior é a velocidade de voo que pode ser praticada mantendo a fotografia sem rastros, e consequentemente um maior rendimento em campo.
Resolução e Tamanho do Sensor
Outros dois fatores cruciais, são resolução e tamanho do sensor. Apesar de cada um ter sua própria influência, vamos ver que existe uma relação muito forte entre eles, e, por isso, devem ser tratados juntos.
Existem diversos tamanhos de sensores no mercado, mas vou focar especificamente em dois tamanhos, mas a lógica vale para quaisquer outros. O sensor de referência para fotografia profissional, é o sensor Full Frame (FF), que é o sensor que tem o mesmo tamanho do filme de 35mm de cinema, utilizado por toda indústria fotocinematográfica. Acontece, que por motivos diversos, como o próprio tamanho físico, ou o custo de produção, os fabricantes adotaram os sensores cortados (crop) com dimensões menores que o sensor FF, como é o caso do sensor APS, que tem o tamanho de 2/3 do sensor profissional. Observe as imagens abaixo:


Temos na primeira imagem, uma mesma fotografia tirada do mesmo local, com a mesma lente, alterando-se apenas o tamanho do sensor da câmera utilizada. E na segunda imagem, uma representação geométrica do que acontece com o ângulo de visão quando se altera o tamanho do sensor. Desta forma, um sensor FF (o maior comercialmente fabricado), conseguirá na mesma altitude e mesma lente, cobrir uma área maior numa única fotografia, quando comparado com concorrentes cropados (1/2 ou 2/3 na sua maioria), podendo representar até 100% a mais de área em uma única imagem. Isto tem impacto tanto no tempo de voo, como no número de fotos necessárias para cobrir determinada área.
Em contrapartida, aumentar o tamanho do sensor, sem aumentar a resolução em pixels (pontos por foto), iria reduzir a densidade de pixels por polegada quadrada, o que teria consequência na resolução das fotos ou na distância entre pontos do levantamento. Assim, uma câmera adequada é aquela que tenha o maior sensor e a maior resolução possível, sendo que o aumento da resolução tem que ser na razão quadrada do aumento do tamanho do sensor para a manutenção da mesma densidade de pixels.
Lentes de Baixa Distorção
Por último, e não menos importante, não podemos deixar de falar das lentes utilizadas, e entender como elas impactam tanto no rendimento de área, como na qualidade dos produtos produzidos. Primeiro, entender que as lentes tem características próprias de ângulo de visão, quanto menor a distância focal, maior o ângulo de visão. Veja na imagem abaixo:

As distâncias focais entre 35mm e 50mm são consideradas lentes “normais”, por serem as que mais se assemelham à visão humana em termos de zoom e de distorção. Quanto mais aumentamos a distância focal, menor fica nossa área (ângulo) de visão, e mais próximo ficamos do alvo, são chamadas lentes tele-objetivas. Do outro lado, quanto menos diminuímos a distância focal, maior fica o ângulo (área) de visão, e mais distantes nos tornamos do alvo, são chamadas lentes grande angulares.
Contudo, em qualquer um dos casos, quanto mais nos afastamos das distâncias normais, distorções óticas começam a aparecer, no caso das tele-objetivas, as distorções ocorrem das extremidades para o centro, tornando os objetos menores, mais magros ou até com sensação de implosão, do que elas são na realidade. Da mesma forma, no caso das grandes angulares, as distorções ocorrem do centro para as bordas, tornando as coisas maiores, mais gordas ou até com sensação de explosão, do que elas são na realidade. E ainda, em ambos os casos, quando mais se distancia do centro da imagem, mais as linhas se curvam, no sentido das distorções citadas acima.
Em termos de fotogrametria, quanto maior o campo de visão melhor (porque isso representaria ganho de área numa única foto), contudo, como já falamos, quanto mais nos afastamos dias distancias normais, distorções começam a aparecer. Veja a imagem abaixo:

Veja este exemplo de uma lente grande angular. Quanto mais o olhar se distancia do centro da imagem, mais esticada e com linhas distorcidas ela fica. Existe apenas uma fração de área central, que realmente é confiável para fins de fotogrametria, e exatamente por conta dessas distorções que se utiliza a sobreposição de fotos no levantamento. A sobreposição deve ser calculada com base no calculo percentual de área central da lente, onde as distorções começam a aparecer.
Portanto, uma lente de baixa distorção, construída para esta finalidade, tem por objetivo aumentar o limite dessa área central onde as distorções começam, e, por consequência, podem reduzir consideravelmente a área de sobreposição necessária, e assim reduzir o número de fotos.
Existem ainda outras várias características interessantes para se ter num equipamento direcionado para fotogrametria, mas eu não diriam que teriam impacto direto na qualidade e confiabilidade dos resultados como estes 3 itens. Eles iriam dar mais opções de coleta, de superar barreiras ou condições ambientais, maior automação, entre outras coisas, mas não iriam interferir diretamente na confiabilidade do produto. Como por exemplo: melhores ISO, lentes intercambiáveis temperatura de operação, integrações, etc. Mas a ausência destes, não irão entortar linhas, causar linhas com rastros fantasmas ou impactar na resolução diretamente como nos itens mencionados no artigo.
Conclusão
Desta forma, quando falamos de fotogrametria de aplicação profissional, a escolha correta do sensor utilizado (no caso câmera) vai impactar diretamente tanto na produtividade (área possível por voo e custo), como na qualidade e confiabilidade (fidelidade de imagem e precisão geoespacial) dos produtos fornecidos.